“Estenda a mão e ponha no meu lado”
3 de julho de 2018Mateus 9,1-8
5 de julho de 2018Evangelho: Mateus 8, 28-34
“Quando Jesus chegou à região de Gadara, no lado leste do lago da Galileia, foram se encontrar com ele dois homens que estavam dominados por demônios. Eles vinham do cemitério, onde estavam morando. Eram tão violentos e perigosos, que ninguém se arriscava a passar por aquele caminho. Eles começaram a gritar:
— Filho de Deus, o que o senhor quer de nós? O senhor veio aqui para nos castigar antes do tempo?
Acontece que perto dali estavam muitos porcos comendo. E os demônios pediram a Jesus com insistência:
— Se o senhor vai nos expulsar, nos mande entrar naqueles porcos!
— Pois vão! — disse Jesus.
Os demônios foram e entraram nos porcos, e estes se atiraram morro abaixo, para dentro do lago, e se afogaram.
Os homens que tomavam conta dos porcos fugiram e chegaram até a cidade. Lá contaram tudo isso e também o que havia acontecido com os dois homens que estavam dominados por demônios. Então todos os moradores daquela cidade saíram para se encontrar com Jesus; e, quando o encontraram, pediram com insistência que fosse embora da terra deles.”
Reflexão:
Na oração de hoje, peçamos ao Pai a graça de um coração disponível a deixar-se tocar pela Palavra, que não a vê de fora, como estória ou espetáculo.
O trecho do Evangelho de Mateus desconcerta em vários sentidos – pela “possessão”, pela violência, pelos confrontos com Jesus. Para conseguirmos entrar e fazer paralelos com nossa vida, precisamos primeiro compreender que não se trata de um exorcismo. Muitos sintomas físicos e psicológicos (e não dá para separar uma dimensão da outra) eram chamados de “tomados por um demônio”. A medicina da época não tinha os mesmos nomes científicos e diagnósticos que se tem hoje. Se não tomarmos na literalidade, o símbolo tem uma força que nos fala.
Quem nunca se viu tomado por algo tão forte que se sente fora de si, fora do eixo, que o divide internamente, fazendo-o agir e falar de forma impulsiva e violenta? Esses impulsos, “possessões” ou complexos acabam nos levando a fazer morada, a fixar-nos em coisas ou situações que não nos levam a mais vida, que mais aprisionam que libertam. As palavras que dirigimos a Deus nesses momentos, ou ao Filho, mesmo que dentro da ortodoxia (da “doutrina correta”), não vêm de uma experiência profunda de confiança e amor. Fazer memória de algum (ou alguns) desse(s) momento(s) em diálogo com o Senhor, até mesmo contemplando os homens narrados nesta passagem.
Incrivelmente, porém, essas forças inconscientes reconhecem o poder de Deus. Sabem que a presença de Jesus transforma, é capaz de fazê-las perder o domínio sobre a pessoa (“serão expulsas”). Terá “o demônio” mais fé do que a razão que se fecha em sua autossuficiência e não dá espaço para a ação do Filho?
Neste trecho do Evangelho, eles acreditam e obedecem, ao passo que os habitantes da cidade vão ao encontro de Jesus, mas não se deixam encontrar por Ele. Ao contrário, pedem que vá embora de sua terra. Por que? Porque já deu prejuízo demais? Porque já perderam a manada de porcos, não aconteça que percam algo mais?
Será que nunca vivenciei também este lado da experiência provocada pela presença de Jesus? Será que, mesmo não tendo tido a coragem de pronunciar essas palavras, dizê-las com todas as letras, nunca quis que Ele fosse embora, que ficasse de fora da minha vida, dos meus planos? Afinal, quando se faz verdadeiramente presente, mexe, questiona, dá “prejuízos”, faz perder algumas coisas por trocar valores, por colocar a vida – própria e dos outros – em primeiro lugar.
E, se nunca vivenciei nem de leve este conflito, será que Jesus está verdadeiramente presente na minha vida, mesmo que eu cumpra ritos religiosos? Tem tido voz e vez, tem podido atuar, tenho escutado seus chamados e apelos?
A primeira leitura, do capítulo 5 de Amós, é bastante questionadora quanto aos cultos que não vão acompanhados das verdadeiras mudanças de atitude na busca da vida boa para todos. Peçamos ao Pai que deixemos o seu ensinamento ter ressonância em nós e aprendamos a viver como filhos no Filho: “Que a justiça seja abundante como água, e a vida honesta, como torrente perene” (Am 5,24).
Tania Pulier, esteticista da alma, membro da CVX Cardoner e da Família Missionária Verbum Dei