Deus do segredo
21 de junho de 2017Um coração manso, humilde e sereno (Mt 11,25-30)
23 de junho de 2017“— Nas suas orações, não fiquem repetindo o que vocês já disseram, como fazem os pagãos. Eles pensam que Deus os ouvirá porque fazem orações compridas. Não sejam como eles, pois, antes de vocês pedirem, o Pai de vocês já sabe o que vocês precisam. Portanto, orem assim:
‘Pai nosso, que estás no céu,
que todos reconheçam
que o teu nome é santo.
Venha o teu Reino.
Que a tua vontade seja feita aqui na terra
como é feita no céu!
Dá-nos hoje o alimento que precisamos.
Perdoa as nossas ofensas
como também nós perdoamos
as pessoas que nos ofenderam.
E não deixes que sejamos tentados,
mas livra-nos do mal.
[Pois teu é o Reino, o poder e a glória,
para sempre. Amém!]’
— Porque, se vocês perdoarem as pessoas que ofenderem vocês, o Pai de vocês, que está no céu, também perdoará vocês. Mas, se não perdoarem essas pessoas, o Pai de vocês também não perdoará as ofensas de vocês.”
A proposta de cada dia, mas hoje de uma forma toda especial, é orar com o coração. Jesus nos ensina a colocar-nos como filhos diante do Pai. Não multipliquemos, então, as reflexões, mas saboreemos cada palavra e nos deixemos tocar profundamente pela oração das orações, que ensinamos às crianças na mais tenra idade.
As duas primeiras palavras resumem toda a oração. “Pai”. Jesus nos introduz na relação com o seu “Abbá”, o seu Paizinho. Quantas imagens erradas temos de Deus! Um Deus severo, que castiga, vingativo, implacável… Podemos não dizer isso, mas está no fundo e muitas vezes aparece. Outro dia na Crisma, estávamos conversando sobre um dos evangelhos do envio dos discípulos. Se por um lado é verdade que alguns dos termos usados não eram de fácil interpretação, por outro, muitas interpretações foram para o lado de um Deus que ameaça e pune, tão diferente do Deus revelado por Jesus Cristo! Se as imagens de Deus que nós trazemos dentro aparecem nas reflexões, mais ainda no cotidiano. Ameaçamos as crianças – “Deus tá vendo!”, “Deus castiga!” –, não abrimos nosso coração a Ele na oração, vivemos distantes dele e jogando nossas carências nas pessoas, por não nos darmos conta que estamos diante da Fonte do Amor!
E se saboreássemos durante todo o dia essa palavra “Pai”? Diante dela, percebendo que Ele é Santo, é amor, bondade infinita, misericórdia, O louvamos. Reconhecemos que seu Reinado é de plenitude e sua vontade de vida para todos, e pedimos-lhe que seja feita. É Ele o doador de todos os dons, sobretudo dO Seu Dom, o Espírito Santo, capaz de nos guiar por caminhos de vida.
A segunda palavra é “nosso”. Não é Pai meu, é Pai nosso. Deus é o Pai que nos faz irmãos. Tenho-me deixado fazer irmão do outro? Como tenho vivido a fraternidade e a sorelidade? A minha vontade está alinhada com a do Pai, sendo de vida para todos? Ou se revela nos meus atos uma busca do “para mim”, “para mim”, “para mim”? Como tenho agido e que opções tenho tomado diante dos mais necessitados?
Vivo no centro de São Paulo, e é tão complicado, porque parece que todas as mazelas sociais do país se manifestam em um só quarteirão. Pessoas sem teto, doentes, mendicantes, dependentes químicos, criminosos de colarinho branco, ladrões de “galinha”, violência, sujeira, fome… aff! É difícil caminhar, porque se é abordado por um ou por outro a cada passo. Esse, que muitas vezes é para mim mais um na multidão, um a mais nas estatísticas – e que, diga-se a passagem, enche bastante a paciência –, para o Pai é único, é seu filho amado. Como isso me toca? Como o olhar do Pai para o meu irmão e os seus sentimentos diante dele transformam o meu olhar e as minhas atitudes? Uma vez ouvi uma estória de uma menina que carregava o seu irmão, pouco mais novo que ela. Ela mal conseguia dar conta. Alguém a parou e perguntou: “Mas como você carrega tanto peso?” Ao que ela respondeu: “Ele não é um peso. Ele é o meu irmão!”
Pedir ao Pai “nosso” o “pão nosso”, e pedir-lhe também o perdão por todas as vezes que as minhas escolhas mais impedem que impulsionam a partilha do pão. Reconhecer diante do seu amor infinito quais são essas escolhas e pedir-lhe a graça de viver como filha e como irmã, não nos deixando cair na tentação que rompe o amor e livrando-nos de todo o mal. Amém!
Tania Pulier, jornalista e teóloga, membro da CVX Cardoner e da Família Missionária Verbum Dei