Sou quem pareço ser? (Lucas 16, 9-15)
8 de novembro de 2014O perdão e a fé – Lucas 17, 1- 6
10 de novembro de 2014PREPARAÇÃO ESPIRITUAL
“Vinde, Espírito Criador,
Visitai as almas dos Vossos fiéis;
e enchei da graça divina
os corações que criastes!
Vós sois o nosso Consolador,
dom do Deus Altíssimo,
fonte viva, fogo, caridade,
e unção espiritual.
Vós derramais sobre nós os sete dons;
vós o dedo da mão de Deus;
vós o prometido do Pai;
vós que pondes nos nossos lábios o tesouro da vossa palavra.
Acendei com a vossa luz a nossa inteligência;
infundi o vosso amor nos nossos corações,
e com o vosso perpétuo auxílio
fortalecei a nossa débil carne.[1]
TEXTO BÍBLICO: João 2.13-22
Jesus vai ao Tempo
Mateus 21.12-17; Marcos 11.15-19; Lucas 19.45-48.
13Alguns dias antes da Páscoa dos judeus, Jesus foi até a cidade de Jerusalém. 14No pátio do Templo encontrou pessoas vendendo bois, ovelhas e pombas; e viu também os que, sentados às suas mesas, trocavam dinheiro para o povo. 15Então ele fez um chicote de cordas e expulsou toda aquela gente dali e também as ovelhas e os bois. Virou as mesas dos que trocavam dinheiro, e as moedas se espalharam pelo chão. 16E disse aos que vendiam pombas:
— Tirem tudo isto daqui! Parem de fazer da casa do meu Pai um mercado!
17Então os discípulos dele lembraram das palavras das Escrituras Sagradas que dizem: “O meu amor pela tua casa, ó Deus, queima dentro de mim como fogo.”
18Aí os líderes judeus perguntaram:
— Que milagre você pode fazer para nos provar que tem autoridade para fazer isso?
19 Jesus respondeu:
— Derrubem este Templo, e eu o construirei de novo em três dias!
20Eles disseram:
— A construção deste Templo levou quarenta e seis anos, e você diz que vai construí-lo de novo em três dias?
21Porém o templo do qual Jesus estava falando era o seu próprio corpo. 22 Quando Jesus foi ressuscitado, os seus discípulos lembraram que ele tinha dito isso e então creram nas Escrituras Sagradas e nas palavras dele.
1. LEITURA
Que diz o texto?
Padre Gabriel Mestre
ü Algumas perguntas para ajudar-te em uma leitura atenta…
Para onde Jesus se dirigia? Que festa se celebrava? O que Jesus encontrou no Templo de Jerusalém? Qual foi a atitude de Jesus? O que fez? O que perguntaram os chefes dos judeus a Jesus? Qual foi sua resposta? Como o Senhor responde? De que maneira os chefes reagem? Que reflexão fazem os discípulos sobre Jesus depois deste episódio?
Algumas considerações para uma leitura proveitosa…
No dia 9 de novembro, a liturgia da Igreja celebra a festa da Dedicação da Basílica de São João do Latrão. Por tratar-se de uma festa, não se celebra o 32º Domingo do Tempo Comum.
Mesmo que o Vaticano seja a residência do Papa, no sentido estrito, a Catedral de Roma não é a Basílica de São Pedro, mas a de São João do Latrão. Trata-se de um grande templo, uma das quatro Basílicas Maiores de Roma e cujo título oficial é “Arquibasílica do Salvador e dos santos João Batista e João Evangelista”. A referência do Latrão se deve à família nobre dos Lateranos que, no séc. III, doou os terrenos para a construção da Igreja. É a Catedral do Papa, onde se celebra a missa da Quinta-Feira Santa e a de Corpus Christi. Há uma inscrição na fachada que diz “mãe e cabeça de todas as igrejas da cidade de Roma e de toda a terra”.
As grandes religiões de hoje e de todos os tempos possuem “templos” para prestar culto a seu Deus. Nossos pais na fé chamam de “Sinagoga” a seus templos atuais; os islâmicos chamam seus lugares sagrados de “Mesquita”, e os cristãos, em geral, damos o título de “Igreja” ou “templo”.
O que é um “templo”? Para as grandes religiões, é sempre um espaço sagrado onde o homem se encontra com seu Deus. Esta definição é aplicável a qualquer dos três exemplos que indicamos no parágrafo anterior. Parece-me importante que se retenha esta definição porque ela nos dará a chave para entender o relato sagrado que hoje nos cabe comentar.
Em um primeiro nível, o texto evangélico deste domingo pode surpreender-nos um pouco, quando detectamos em Jesus uma atitude tão firme e decidida na expulsão dos que vendiam animais e trocavam moedas nas portas do Templo.
À primeira vista, corremos o risco de “interpretar mal” o relato, pensando que se trata de um simples problema de não misturar o econômico com o culto. Na realidade, o sentido do texto é muito mais profundo.
Este episódio está narrado nos quatro evangelhos. Os três sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) situam-no no final do ministério público de Jesus, quando já está próxima a páscoa. O Evangelho de João, que compartilhamos hoje, situa esta cena no começo da atividade reveladora de Jesus.
O Templo era o centro da fé e da espiritualidade do Povo da Antiga Aliança. Por isso, a piedade do israelita está profundamente marcada pela devoção e amor ao Templo. Refletem esta realidade as belas reflexões que fazem os salmos, as peregrinações, a orientação das sinagogas e dos orantes para o santuário de Jerusalém em qualquer parte do mundo. A Lei de Moisés exigia que os animais que iam ser sacrificados no Templo não tivessem nenhum defeito. Visto que muitos judeus vinham de longe, deviam comprar os animais perto do Templo. Todo israelita maior de 20 anos devia pagar o imposto do Templo com umas moedas especiais (não romanas), que na época de Jesus já não se cunhavam. Por isso, era necessário que houvesse cambistas nos átrios do Templo.
Jesus valoriza o Templo a ponto de chamá-lo de “Casa de meu Pai” (cf. o versículo 16) e o ama apaixonadamente (cf. o versículo 17). Jamais rechaça o Templo, mas como faz com a própria Lei, a qual ele não veio abolir, busca levar tudo à plenitude. Levar à plenitude implica uma passagem, uma nova realidade que está bem descrita no episódio de hoje.
O Evangelista João utiliza muitos recursos literários na composição de seu Evangelho. A um destes recursos os estudiosos da Bíblia chamam de “mal-entendido joaneu”. Em que consiste? Para reforçar uma ideia, sobretudo uma ideia profunda, teológica e espiritual, o evangelista faz com que Jesus “jogue” com algumas palavras que têm duplo sentido ou duplo significado. Por exemplo, em 4.10-15, Jesus fala de uma água viva que a samaritana identifica com a água material; na realidade, ele quer indicar o dom de sua palavra e do Espírito; encontramos outro exemplo em 4.31-34: Jesus fala de um alimento que os discípulos não conhecem, e eles pensam que alguém lhe trouxe de comer; com efeito, Jesus está-se referindo a fazer a vontade do Pai; e assim muitos outros textos.
No relato de hoje, há um “mal-entendido” em relação ao Templo. Os judeus falam do Templo material (versículo 20) e Jesus está falando do Templo que é seu próprio corpo (versículo 21). O Grande Templo de Jerusalém é “espaço” de encontro do homem com Deus, mas Jesus se apresenta como Novo Templo, novo “espaço” de encontro do homem com Deus. Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, é o Templo com letra maiúscula, é quem “purifica”, “limpa” e leva à plenitude o Templo anterior, o Templo da Antiga Aliança.
A partir de Jesus morto e ressuscitado, Novo Templo, ganham novo sentido nossos Templos de pedra, nossas igrejas, onde justamente nos reunimos para celebrar a morte e a ressurreição do Senhor até que Ele venha.
Definitivamente, neste texto percebemos um Cristo que vem purificar o Templo, passando de um “culto antigo”, que necessitava do sangue dos sacrifícios e das moedas oferecidas, para um “culto novo”, onde Ele mesmo é o Templo, espaço de encontro com Deus, realizando um único sacrifício, de uma vez para sempre. Desta forma, o Senhor “paga” com sua morte e ressurreição o “imposto” que o judeu devia pagar constantemente par render culto a Deus.
João narra e, ao mesmo tempo, interpreta o episódio, dando-nos uma síntese teológica de todo o mistério de Cristo, morto e ressuscitado, que irá desenvolver no resto do Evangelho. O convite, definitivamente, é para viver um culto autêntico, novo, profundo, vital, enraizado na pessoa de Jesus… Um culto em “espírito e verdade”, como dirá o mesmo evangelista em 4.23.
2. MEDITAÇÃO
O que o Senhor me diz no texto?
O Papa Bento XVI, no Angelus de 9 de novembro de 2008, convida-nos a refletir:
“ A Palavra de Deus nesta solenidade recorda uma verdade fundamental; o templo de pedra é símbolo da Igreja viva, a comunidade cristã, que já os Apóstolos Pedro e Paulo, nas suas cartas, significavam como “edifício espiritual”, construído por Deus com as ‘pedras vivas’ que são os cristãos, sobre o único fundamento que é Jesus Cristo, por sua vez comparado com a ‘pedra angular’ (cf. 1 Cor 3. 9-11.16-17; 1 Pd 2. 4-8; Ef 2. 20-22). ’irmãos, vós sois edifício de Deus’, escreve São Paulo e acrescenta: ‘santo é o templo de Deus, que sois vós’ (1 Cor 3, 9.17). A beleza e a harmonia das igrejas, destinadas a prestar louvor a Deus, convida também nós seres humanos, limitados e pecadores, a converter-nos para formar um ‘cosmos’, uma construção bem ordenada, em estreita comunhão com Jesus, que é o verdadeiro Santo dos Santos.
Isto aconteceu de modo culminante na liturgia eucarística, na qual a ‘ecclesía’, isto é, a comunidade dos batizados, se reúne para ouvir a Palavra de Deus e para se alimentar do Corpo e Sangue de Cristo. Em volta desta dúplice mesa a Igreja de pedras vivas edifica-se na verdade e na caridade e é plasmada interiormente pelo Espírito Santo transformando-se no que recebe, conformando-se cada vez mais com o seu Senhor Jesus Cristo. Ela mesma, se vive na unidade sincera e fraterna, torna-se assim sacrifício espiritual agradável a Deus.
Queridos amigos, a festa de hoje celebra um mistério sempre atual: isto é, que Deus quer edificar no mundo um templo espiritual, uma comunidade que o adore em espírito e verdade (cf. Jo 4, 23-24). Mas esta celebração recorda também a importância dos edifícios materiais, nos quais as comunidades se reúnem para celebrar o louvor de Deus. Cada comunidade tem portanto o dever de conservar com cuidado os próprios edifícios sagrados, que constituem um precioso património religioso e histórico. Invoquemos então a intercessão de Maria Santíssima, para que nos ajude a tornar-nos como ela, ‘casa de Deus’, templo vivo do seu amor”.[2]
Agora perguntemo-nos:
Reconheço Jesus como o lugar do encontro com Deus? Estou consciente de que meu corpo é templo do Espírito Santo? Que consequências tem isso para meu comportamento? Sinto-me pedra viva do templo de Deus, que é a Igreja?
3. ORAÇÃO
O que respondo ao Senhor me fala no texto?
Ó Deus,
que edificais o vosso templo eterno com pedras vivas e escolhidas,
difundi na vossa Igreja o Espírito que lhe destes,
para que o vosso povo cresça sempre mais,
construindo a Jerusalém celeste.[3]
4. CONTEMPLAÇÃO
Como ponho em prática, me minha vida, os ensinamentos do texto?
“A Deus, o Senhor, pedi uma coisa,
e o que eu quero é só isto:
que ele me deixe viver na sua casa
todos os dias da minha vida,
para sentir, maravilhado, a sua bondade
e pedir sua orientação” (Sl 27.4).[4]
5. AÇÃO
Com que me comprometo para demonstrar mudança?
Estarei em oração com Jesus no meu quarto, reconhecendo que onde está Jesus está o templo de Deus. Levarei em conta que meu corpo é templo do Espírito Santo e o respeitarei. Preocupar-me-ei com ajudar em algo o templo de minha comunidade paroquial.
“Deus habita não somente em templos construídos por homens, nem em casas feitas de pedra e de madeira, mas principalmente na alma feita à imagem de Deus e construída por ele mesmo, que é seu arquiteto”.
São Cesário de Arlés
[1] Santo João Paulo II.
[2] http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/angelus/2008/documents/hf_ben-xvi_ang_20081109_po.html
[3] Oração da Coleta da Missa para a Festa da Dedicação da Basílica de São João do Latrão.
[4] Salmo 27 (26).4.