Jejuar, orar e servir com amor (Mt 6,1-6.16-18)
18 de fevereiro de 2015Por que jejuamos? (Is 58,1-9a)
20 de fevereiro de 2015Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia”.
Depois Jesus disse a todos: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará.
Com efeito, de que adianta a um homem ganhar o mundo inteiro, se se perde e se destrói a si mesmo?”
Esse trecho do evangelho nos leva a refletir sobre uma questão fundamental, que permeia toda a história da humanidade.
Diante de toda a riqueza que Deus colocou à nossa disposição, para nos sustentar, para nos abrigar das intempéries da natureza, para nos assegurar uma vida tranquila sobre a terra, qual é a nossa reação?
Diante de todos os dons que temos, de toda a capacidade criativa que Deus nos concedeu, quando nos criou à sua imagem e semelhança, para participarmos de forma privilegiada de seu reino de amor, qual é a nossa reação?
Penso que seja uma das possibilidades de olhar a questão proposta por Jesus, e que pode nos ajudar a orar na perspectiva do lema e do tema da Campanha da Fraternidade de 2015.
Ajudava-me na oração retomar o relato da queda, especificamente os versículos 4 e 5 de Gênesis, capítulo 3: “Então a serpente disse para a mulher: ‘De modo nenhum vocês morrerão. Mas Deus sabe que, no dia em que vocês comerem o fruto, os olhos de vocês vão se abrir, e vocês se tornarão como deuses, conhecedores do bem e do mal’…”
Tudo o que Deus criou e todos os dons que nos foram dados devem estar a serviço de toda a humanidade, sem distinção de cor ou credo, porque foi para nosso desfrute que Ele os criou, porém há uma dúvida que nos amedronta e nos leva ao fechamento, nos impedindo de praticar o amor solidário e fraterno.
E se nossos olhos estiverem fechados e nada disso for verdade? E se eu estiver sendo bobo, enganado e depois ficar passando necessidades e não tiver ninguém por mim?
Medo. Esse é o sentimento que nos leva a todo o mal. Por isso, penso que o medo é o que se opõe ao amor.
Muitas vezes, a serpente escondida nas sombras que habitam nosso íntimo, astuta como ela só, se utiliza de vários sentimentos nobres, para nos povoar de medos.
Pensando na promessa da serpente, eu me perguntava: nossos olhos vão se abrir para o quê? Para os privilégios que o acúmulo de bens, riquezas e poder podem nos trazer e nos fazer sentir como deuses?
É tão comum ouvirmos a expressão: “ele subiu na vida”, para expressar a ascensão social e econômica de alguém, normalmente falada em tom de elogio, mas também de inveja ou deboche.
Evoluir, avançar e desenvolver os talentos são atitudes belas e importantes para o bem comum, contudo, após conseguirmos uma ascenção, o nobre sentimento de querer melhorar, querer avançar, pode ser convertido em medo. Medo de que outros, que não conseguiram se desenvolver ou que não tiveram as mesmas condições que tivemos, usufruam do que conseguimos e nós, que tanto trabalhamos, fiquemos “a ver navios”.
Dessa forma, fomos criando certos sonhos e desejos que são fruto da “isca” que a serpente lançou, e nós mordemos.
Construímos uma sociedade que nos força a trabalhar como loucos, sonhando com a aposentadoria que irá nos permitir desfrutar de todas as benesses, e cunhamos a frase “ganhar a vida”, significando o acúmulo de riquezas que nos permitirá o desfrute na aposentadoria.
Mas está errado se precaver, para ter uma velhice tranquila? Penso que não. Contudo, deveria ser assim?
O que nos tem afastado de servir, de perder a vida em nome de Jesus? É possível mudar a situação? O que temos de fazer? Há pessoas próximas que necessitam do nosso serviço? Temos tido o cuidado de observar, ou nossos olhos estão muito voltados para nossas necessidades?
Olhemos para as pessoas mais próximas de nós, que precisam do nosso serviço, da nossa doação e pensemos no que é possível fazer. Pensar em grandes ações pode nos assustar, fazer-nos achar que não é possível ter êxito, então, comecemos com pequenas ações de serviço ao outro, na nossa família, no trabalho, na escola e nos deixemos contaminar pelo amor-doação.
A nossa estrutura social nos ajuda a sermos solidários e prestativos, a criarmos laços de fraternidade? Já estamos cansados e perdemos a esperança? Não há mais solução?
Em nossa cruz, também pesam os problemas que atingem toda a sociedade, que possuem raízes estruturais e que, de forma acentuada, influenciam nossa vida individual. Não há como carregar somente parte da cruz.
Na minha oração, ajudava a perceber, na primeira leitura de hoje, que Moisés fala ao povo “vos propus a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e teus descendentes”. Ora, se nossa sociedade não fizer o caminho da vida, tanto mais difícil será para nós e nossos descendentes fazê-lo. Portanto, em nosso serviço também precisamos considerar “perder a vida”, entregando parte dela para a construção de estruturas sociais mais justas.
Que o Espírito Santo esteja conosco nos iluminando, fortalecendo e guiando nossos passos de entrega da vida para a construção de um mundo mais fraterno. Amém!
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João Batista Pereira Ferreira – Família Missionária Verbum Dei – Belo Horizonte – MG