“Ser como as crianças”
2 de outubro de 2018O “sim” de um homem de paz
4 de outubro de 2018Evangelho: Lucas 9, 57-62
“Quando Jesus e os discípulos iam pelo caminho, um homem disse a Jesus:
— Eu estou pronto a seguir o senhor para qualquer lugar onde o senhor for.
Então Jesus disse:
— As raposas têm as suas covas, e os pássaros, os seus ninhos. Mas o Filho do Homem não tem onde descansar.
Aí ele disse para outro homem:
— Venha comigo.
Mas ele respondeu:
— Senhor, primeiro deixe que eu volte e sepulte o meu pai.
Jesus disse:
— Deixe que os mortos sepultem os seus mortos. Mas você vá e anuncie o Reino de Deus.
Outro homem disse:
— Eu seguirei o senhor, mas primeiro deixe que eu vá me despedir da minha família.
Jesus respondeu:
— Quem começa a arar a terra e olha para trás não serve para o Reino de Deus”.
Reflexão:
Nesta oração, peçamos ao Pai a graça de seguir Jesus com decisão, no chamado a mais vida que nos apresenta.
Lucas apresenta 3 casos de vocação. Neles podemos colocar todos, inclusive o nosso, para descobrir a atitude que costumamos ter diante do chamado.
O primeiro caso é o entusiasta. Ele se empolga com a experiência com Jesus e já vai logo dizendo: “Eu estou pronto a seguir o senhor para qualquer lugar onde o senhor for”. Na resposta de Jesus, podemos desconfiar: está pronto mesmo? O Senhor acolhe esta resposta inicial, este entusiasmo, o desejo primeiro de quando o coração salta diante dele. Mas sabe que pode ser fogo de palha, que apenas isso não segura uma vida em seu caminho – em qualquer que seja o caminho, uma vida consagrada, o ministério ordenado, o casamento, um trabalho vivido como missão, com propósito e significado. Por isso, alerta (usaremos outra tradução mais clara agora): “o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça”. Geralmente, a resposta entusiasmada vem de uma experiência muito bonita e “gostosa”, com sabor de Reino, de termos encontrado o lar original, de volta pra casa. Mas o dia a dia não é assim. O caminho é árduo. Não há muito repouso e aconchego nele. O lar – e o Reino – estão para ser criados, em meio a muita coisa contrária a eles.
– Que experiências temos dessas respostas entusiasmadas que topam com as pedras no caminho logo em seguida? Ao lembrar delas, dialogar: Jesus, por que o seu aviso então?
No segundo exemplo de vocação, Jesus faz um chamado claro e direto. Não houve dúvidas quanto ao chamado, ele foi compreendido. A resposta, porém, foi: “Senhor, primeiro deixe que eu volte e sepulte o meu pai”. Era uma coisa boa, sepultar os mortos era considerado uma obra de misericórdia. E quantas coisas boas tentamos passar na frente do chamado! Responder a ele não é escolher entre o bom e o ruim, mas entre o bom e o melhor. E o melhor não é genérico, não é o melhor para todos, não é o melhor porque aparentemente parece o mais santo, o mais bonito, o mais nobre, o que a maioria vai olhar e falar: “Nossa, que santo!”, mas o melhor para mim, o que me leva a crescer mais como pessoa, amadurecer mais, amar melhor. No entanto, supõe uma escolha e, por isso, uma renúncia. Um autor dizia sobre responder à vocação (qualquer que seja ela): Há sempre uma ineludível renúncia.
– Em que momentos quero me iludir que posso ter tudo ao mesmo tempo, viver tudo ao mesmo tempo? O que o Senhor me diz?
O terceiro exemplo traz a fala de alguém para Jesus. Não sabemos como foi o chamado, se houve um tempo de busca e discernimento, ou se aqui é o começo deste tempo, a disposição inicial oferecida. Resposta ou disposição, ela é carregada do apego afetivo, especificamente à família: “Eu seguirei o senhor, mas primeiro deixe que eu vá me despedir da minha família”. Para nós, brasileiros, de uma maneira geral, este nos pega. Que grudes familiares vivemos! Se pudermos fazer puxadinhos para não sair da barra da saia da mãe (ou pai, irmã, filho…), fazemos. No geral, vemos grandes filhinhos e filhinhas da mamãe, que não acabam de pegar a vida nas mãos, que não dão conta de pôr a mão no arado e não olhar pra trás. Isso se reflete na vida pessoal, pois não se acaba de assumir relacionamentos, de caminhar na direção de criar lares, pois a ameaça de correr de volta pra mamãe fica velada por trás como um fantasma (isso quando se saiu minimamente); na vida profissional, quanta infantilidade nas relações de equipe, quanto mi-mi-mi e cri-cri, por não se terminar de focar na missão, de perceber a importância do serviço para o outro (o cliente) e ficar: “Fulano me olhou torto; a fala de siclano foi para mim…”; e na vida social. Não será que a situação tão difícil pela qual estamos atravessando como país não é fruto também da falta de maturidade na busca do bem comum? E não joguemos para os políticos, olhemos para nós, cristãos, e o que fazemos para encontrar caminhos para o país, sobretudo para os mais pobres. Será que qualquer falazinha nos leva e não buscamos a consistência dela? Basta colocar palavras mágicas no meio, como Deus e família, para nos convencer? (ou nos enganar?)
Peçamos ao Espírito que nos ajude a assumir o seguimento de Jesus na construção do Reino com amor, ou seja, com decisão e compromisso, no que estivermos sendo chamados por Ele hoje.
Tania Pulier, esteticista da alma, membro da CVX Cardoner e da Família Missionária Verbum Dei