“ O fermento dos fariseus e de Herodes”
13 de fevereiro de 2018Lucas 9,22-25
15 de fevereiro de 2018Evangelho: Mateus 6, 1-6; 16-18
“— Tenham o cuidado de não praticarem os seus deveres religiosos em público a fim de serem vistos pelos outros. Se vocês agirem assim, não receberão nenhuma recompensa do Pai de vocês, que está no céu.
— Quando você der alguma coisa a uma pessoa necessitada, não fique contando o que fez, como os hipócritas fazem nas sinagogas e nas ruas. Eles fazem isso para serem elogiados pelos outros. Eu afirmo a vocês que isto é verdade: eles já receberam a sua recompensa. Mas você, quando ajudar alguma pessoa necessitada, faça isso de tal modo que nem mesmo o seu amigo mais íntimo fique sabendo do que você fez. Isso deve ficar em segredo; e o seu Pai, que vê o que você faz em segredo, lhe dará a recompensa.
— Quando vocês orarem, não sejam como os hipócritas. Eles gostam de orar de pé nas sinagogas e nas esquinas das ruas para serem vistos pelos outros. Eu afirmo a vocês que isto é verdade: eles já receberam a sua recompensa. Mas você, quando orar, vá para o seu quarto, feche a porta e ore ao seu Pai, que não pode ser visto. E o seu Pai, que vê o que você faz em segredo, lhe dará a recompensa.
— Quando vocês jejuarem, não façam uma cara triste como fazem os hipócritas, pois eles fazem isso para todos saberem que eles estão jejuando. Eu afirmo a vocês que isto é verdade: eles já receberam a sua recompensa. Mas você, quando jejuar, lave o rosto e penteie o cabelo para os outros não saberem que você está jejuando. E somente o seu Pai, que não pode ser visto, saberá que você está jejuando. E o seu Pai, que vê o que você faz em segredo, lhe dará a recompensa.”
Reflexão:
Hoje, Quarta-feira de Cinzas, iniciamos o tempo de Quaresma. Nas duas maiores festas da nossa fé – o Natal e a Páscoa, a Encarnação e a Morte e Ressurreição de Cristo –, a Igreja nos oferece tempos de preparação (Advento e Quaresma) para aprofundarmos no grande Mistério de Amor, que na verdade é um só – o Filho de Deus que se faz um de nós até a entrega máxima de amor, para que possamos participar da sua vida, a vida plena que tanto almejamos, no Espírito. É tão grande que precisamos de uma caminhada para adentrar, deixar-nos ser conduzidos pouco a pouco para dentro desta maravilha. Pedir, então, a graça de fazermos de fato caminho nesta Quaresma.
Hoje, Quarta-feira de Cinzas, o trecho do Evangelho de Mateus nos permite refletir sobre as três práticas propostas como exercícios espirituais neste caminho de preparação: o jejum, a esmola e a oração. Precisamos olhar para o seu sentido para de fato fazermos boas escolhas em concretizações que de fato nos ajudem.
Deus quer que sejamos plenamente humanos, foi isso que Jesus Cristo nos ensinou. A conversão a que somos chamados na Quaresma vai na direção de viver melhor a nossa humanidade. Para isso, as práticas devem nos ajudar a crescer nas relações conosco mesmos, com os outros, com Deus e com o mundo ao nosso redor. Esse é o seu sentido.
O jejum quer nos levar a um equilíbrio na relação conosco mesmos. Privar-nos de algo que de fato nos faça falta quer nos levar a uma maior liberdade, a não sermos dirigidos por nossos sentidos, mas a integrá-los, sabendo que fazem parte do que nós somos, mas somos mais do que isso. Há dois dias apenas em que a Igreja propõe um jejum que de fato se concretiza em refeições fugazes e privação da carne – Quarta-feira de Cinzas e Sexta-feira da Paixão. Neles, além do reequilíbrio, nos unimos aos irmãos que não têm o que comer. Aqui já podemos questionar algumas tradições que não cumprem o sentido profundo. Por exemplo, comer bacalhau na Sexta-feira da Paixão, um prato delicioso e caríssimo. Só pra pensar…
Mas, falando da Quaresma como um todo, o jejum não necessariamente precisará ser de comida. Para alguns pode ser, quando ela se torna um vício. Par outros, porém, poderá ser da língua – não abrir a boca para falar mal de alguém –, para outros das redes sociais, que também têm se tornado um vício e nos tomado muito tempo, tempo este que poderia ser usado com melhor proveito, seja nas relações presenciais, seja no descanso, no estudo e mesmo na oração. Lembrando que 40 dias é um tempo de se ganhar um hábito, super significativo, por isso, para se exercitar em coisas importantes à vida e que poderão ser mantidas totalmente ou em alguma medida depois. Enfim, para a sua escolha, veja-se com sinceridade diante de Deus e pergunte a Ele:
– Senhor, que ponto seria mais importante para eu me trabalhar nestes 40 dias como jejum a fim de me reequilibrar?
O segundo exercício é a esmola. O próprio nome é feio, porque foi entendido por muito tempo como dar moedinhas aos pobres, o que nos coloca numa posição superior a eles e nem sempre é o que precisam. Difícil romper com esse entendimento tão tradicional! Mas, procuremos, em nossa oração, perguntar como Ele desejaria que fosse a humanidade, o que sonha para as relações entre as pessoas e o Seu Filho ensinou. Colocar-nos aí: como estão as minhas relações? Olhar para as relações com os próximos mais próximos e também para os menos favorecidos: como os enxergo? Como os trato? Em que as minhas escolhas do dia a dia os afetam? O que me sobra que falta a eles? Olhar diante de um Deus que nos pergunta: “Onde está o seu irmão?”
A Campanha da Fraternidade nos ajuda a cada ano a concretizar o amor fraterno sob um aspecto social urgente. Neste ano, o tema é “Fraternidade e superação da violência” e o lema “Em Cristo somos todos irmãos” (Mt 23,8). Questionar-nos e pedir o olhar do Senhor:
– Senhor, como tenho vivido a fraternidade? Em que eu promovo a paz e em que sou agressivo(a) e violento(a)? O meu jeito de viver fala que somos todos irmãos? Em que precisaria mudar?
Neste aprofundamento, procurar concretizar em um ponto a ser trabalhado para melhorar as relações pessoais e sociais. Qualquer um, o que você mais precisar, mas que seja concreto. Ex.: Não comprar XXX nestes 40 dias e oferecer esse dinheiro para XXX. Parar diante dos pais para ouvi-los olhando nos olhos e responder com paciência. Visitar XXX vezes a entidade que ajudo financeiramente, para conhecer as pessoas, dar do meu tempo e atenção a elas. Etc.
Por fim, a oração. Nenhuma das ações anteriores deve ser feita por voluntarismo, mas a partir da experiência de saber-se amado por Deus, presenteado com tantos dons que são para viver bem e ajudar os irmãos a assim vive-lo. De onde vem essa experiência? Da oração. Infelizmente, mesmo ela, na correria do nosso dia a dia, às vezes se torna mecânica, como o cumprimento de um hábito no piloto automático e já não nos alimenta nem nos transforma. Vivemos carentes por aí, mendigando atenção, escuta, compreensão e amor, quando temos todos os dias a oportunidade e o chamado de conectar-nos à Fonte do Amor. A partir daí já podemos refletir:
– O que precisaria mudar na minha oração – no tempo dedicado e no jeito de fazê-la – para que de fato seja experiência de Deus? (que é dom, mas há atitudes da nossa parte que favorecem. Que atitudes são essas que da minha parte devo colocar para viver a oração como Santa Tereza a descrevia: “Orar é conversar muitas vezes a sós com quem sabemos nos ama”?)
Peçamos ao Espírito a graça de deixar-nos conduzir por Ele, para viver com sentido os exercícios quaresmais e realmente deixar-nos transformar por eles, crescendo em humanidade.
Tania Pulier, jornalista e teóloga, membro da CVX Cardoner e da Família Missionária Verbum Dei