“Fez o que o anjo do Senhor havia mandado”
20 de março de 2017Eu afirmo a vocês que isto é verdade: enquanto o céu e a terra durarem, nada será tirado da Lei (Mt 5, 17-19)
22 de março de 2017Então Pedro chegou perto de Jesus e perguntou:
Começo a minha oração com a mesma postura de Pedro. Postura de diálogo, de abertura ao que o Senhor tem a dizer sobre assuntos específicos. Pedro pergunta a Jesus quantas vezes se deve perdoar. Começo a oração num desejo profundo de estabelecer diálogo com Deus para me tornar consciente do que eu espero de Deus e do que Deus espera de mim.
Pedro se dirige a Jesus com uma pergunta matemática: quantas vezes devo perdoar? Esse primeiro trecho já me chama a atenção. Me leva a examinar minha oração. Muitas vezes vou para a oração com perguntas “matemáticas”. Me dirijo a Jesus querendo respostas exatas. O que fazer? Como fazer? A quem? Para quem? Quantas vezes? E já neste início, Jesus me convida a mais! Expanda seu coração! Receba da oração o que ela tiver pra te dar, de coração aberto. Acolha com generosidade o que Deus quer dar a você com generosidade!
Pedro tem uma ideia de como deve exercitar o perdão. Mas Jesus propõe que ele vá além. Pedro propõe um número generoso, mas Jesus propõe um número ainda maior, indefinido. Jesus propõe a Pedro nada menos do que o Reino do Céu, ou o Reino de Deus. E para explicar como seria esse Reino, conta uma parábola.
Leio várias vezes a parábola. Com que personagem me identifico? Qual o trecho me chama mais atenção? O que esta parábola diz especificamente para a minha vida?
Diz a parábola que o criado tinha uma dívida enorme. Devia milhões de moedas de prata. E pede paciência ao patrão. Me chama a atenção o fato do criado pedir um prazo. O que diz da intenção dele de, um dia, fazer o pagamento. Não esperava a compaixão do patrão. Me identifico com isso. Estou sempre achando que posso merecer, que posso eu mesma consertar tudo, que posso sozinha salvar a tudo e a todos. Muitas vezes não conto com o Amor e a Misericórdia do Pai.
O empregado pede um prazo, mas o patrão perdoa-lhe a dívida! O patrão é muito mais generoso do que o empregado esperava. O empregado não consegue pedir o perdão, fazia questão de pagar. Assim, ele não consegue experimentar o perdão. E como não consegue experimentar o perdão, não consegue perdoar… Só consigo me doar gratuitamente se entro na gratuidade da vida. Muitas vezes não consigo desfrutar de tudo, porque me sinto em dívida.
Fatalmente deixamos e deixaremos marcas nas vidas das pessoas. Marcas positivas e negativas. Pessoas deixam marcas em nossas vidas. Positivas e negativas. Do mesmo jeito que a dívida do criado era impossível de ser paga, as marcas deixadas são, muitas vezes, impossíveis de serem apagadas. E o único caminho saudável para conviver com essas marcas é o perdão. Perdão aos outros e perdão a nós mesmos.
“O patrão teve pena dele, perdoou a dívida e deixou que ele fosse embora”. Perdoar é deixar ir embora… E o deixar ir é mais libertador para quem perdoa do que para quem é perdoado. O criado tem a chance de se libertar, mas desperdiça. Como não confia na misericórdia do patrão, também não consegue ser misericordioso.
“Vendo o que havia acontecido, os outros empregados ficaram revoltados, procuraram o patrão e lhe contaram tudo.”
É comovente a sensibilidade dos outros empregados ao acontecido. Não simplesmente acusaram o empregado. Não condenaram, não julgaram, não quiseram fazer justiça com as próprias mãos. Se deixaram envolver pela situação! E depois de se deixarem afetar, de ter suas vidas implicadas no fato (ficaram revoltados, em uma outra tradução diz-se que “ficaram muito tristes”), fizeram o que achavam que era correto (procuraram o patrão e lhe contaram tudo). Sentiram junto e, depois, procuraram quem tinha autoridade e responsabilidade para agir.
Esse trecho me chama a atenção porque aponta para a intolerância que há em mim. Por quem tenho me entristecido? Consigo me entristecer com as dores dos outros, ou estou apenas preocupada em encontrar culpados para as minhas próprias dores? Os empregados não tinham sido diretamente afetados, pessoalmente afetados, mas se entristeceram. Talvez pela prisão do devedor, talvez pela miséria do criado perverso, que foi incapaz de agir com a mesma misericórdia com que foi tratado.
O Reino de Deus é pura misericórdia. Se quisermos começar a viver esse reino teremos que valorizar mais e exercitar mais esse sentimento.
Jesus repete mais uma vez a máxima de outras passagens, não faça aos outros o que não gostaria que fizessem com você. Ou ainda, ame o próximo como a ti mesmo. Ou, perdoa-me Senhor como eu tenho perdoado. Mas nesse Evangelho, mais do que dizer mais do mesmo, experimento que Jesus nos dá uma dica preciosa a respeito do amor, da compaixão, do perdão. É preciso antes experimentar cada um desses sentimentos para conseguir transmiti-los.
Esse tempo de Quaresma que estamos vivendo é propício para o perdão. Para me perdoar, para dar o perdão a outros, para pedir perdão. Tempo de ser tão generosa com o outro quanto desejo que sejam comigo. Setenta vezes sete… Tempo de exercitar a tolerância e a paciência, tão raras em nossos dias.
Pollyanna Vieira – Verbum Dei BH